Revista Polis

01 | A quem interessar possa

Tu que abres essa carta nesse momento deves estranhar este fato, pois não é comum encontrar mensagens aprisionadas numa garrafa; porém, também deves saber que isto já foi uma maneira de encaminhar mensagens, sejam elas boas ou más. É apenas um instrumento rudimentar dos antigos marinheiros, que em seus últimos suspiros, encaminhavam para quem interessasse a mensagem desejada. Talvez uma ação mais desesperada do que eficaz efetivamente. Mas não estou em desespero, longe disso!

Enquanto fazia um dos percursos mais habitual possível com uma frota de ampla experiência e o mais avançado dos navios, fui acometido por uma tempestade. Não só eu como todos os que estava, a bordo; a tempestade, que mais parecia ter saído daqueles antigos dilúvios mitológicos que afundaram o continente perdido de Atlântida, virou a nossa barca e a partiu em duas… Nada restou, até agora, sem nenhum sobrevivente além de mim. Graças a lei que dá destino a todas as coisas, me encontrei são e salvo em uma ilha, esta de onde escrevo onde a terra é firme e fértil, capaz de abrigar novos grupos, novas pessoas, novos sonhos… Tomei então a decisão de não mais sair e ficar por aqui mesmo, construindo.

Quero dizer, a quem interessar possa, que estou fundando uma cidade, uma pólis, ainda sem nome, buscando encontrar modelos de beleza na natureza para que possamos fazer a conexão entre ela e os seres humanos e também nos antigos que deixaram a tradição do saber e do conhecimento. Estou sozinho nessa jornada, sou o último sobrevivente de um naufrágio e portanto encaminho essa mensagem em garrafas para aqueles que se predispuserem a atuar de bom coração nessa iniciativa que encabeço. Já não possuo um nome, não o uso mais, já não tenho todos aqueles aparatos que me foram tão caros em outros momentos da vida, mas agora, depois de muito viajar pelo mundo, decidi fincar raízes aqui; aqui onde a água mana da terra e a aurora é sempre rosada.

Refletindo aqui, de longe e sem interrupções, chego a pensar que não apenas a minha embarcação afundou, pois por onde passei encontrei cidades ditas civilizadas que mais pareciam os mais brutos selvagens, encontrei resquícios de civilização onde diziam haver apenas bestas humanas. Pouco a pouco as cidades se afundam em sua própria ganância e egoísmo, em uma má instrução, em uma agressividade sem sentido. As cidades já não abrigam mais seres humanos.

Portanto decidi me instalar nesta ilha, onde utilizarei todo meu conhecimento acumulado ao longo dos anos para plantar uma nova semente, uma nova cidade. Eu não possuo um nome, mas eu sei quem sou! E sei também o que fiz e de onde vim, e aqueles que sintam-se assim também, sem nome ou sem rosto, que juntem-se a mim nesta polis. Não precisam de coordenadas, saberão onde me encontrar.

O Naúfrago

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