Caro amigo viajante,
Tu me perguntas, o porquê de escrever essas mensagens e as embalar numa garrafa de vidro, atirando-as a esmo na esperança que alguém as encontre, como faziam antigos homens do mar e me perguntas por qual razão escrevo esses textos e passo meus dias a escrever poesias? Sobre a primeira pergunta, acredito que não precisa de resposta, tu pegastes uma garrafa e conseguistes localizar-me, e ao estar aqui em minha ilha, em nossa polis, observou como são importantes termos pilares que sustentam os nossos valores e embasam nossas ações, uma árvore de raízes profundas pode crescer para qualquer lugar, pois tem onde alimentar-se. Mas sobre a segunda, acredito que mereça algumas breves palavras para elucidar-lhe o que sinto.
As vezes tenho a impressão de que os homens escrevem cartas quando perdem a coragem de encarar o olhar de seu interlocutor… Não, não, não deve ser isso, meu caro, na verdade escrevemos cartas para evocar à memória esse olhar e dele não mais esquecer para que possamos reconhecê-lo ante os portões que dão acesso à eternidade.
Talvez o senhor encontre nisso uma fraqueza, mas devo dizer que apenas os que são realmente fortes buscam a união; e a buscam porque conseguiram compreender que a vida existe para além de si e que o amor enlaça a todas as coisas… e como deves bem saber, o amor só é possível para os que têm força.
Mas o poeta é um sonhador, sonha que possui a força que ainda não tem, sonha como se o mundo pudesse ser ajustado com o toque da sua pena, como num passe de mágica; mas a vida pede mais, a vida não irá mudar as coisas apenas porque o poeta vislumbrou um vulto da verdade, não, a vida pede mais. A vida pede a tua alma e o teu corpo, tua mente e o teu coração e nada é mais cheio do que o coração do poeta; todas as coisas que aprende, leva não só o que aprende mas com quem aprende. Assim, que em sua alma carrega todas as pessoas em sua memória, goste delas ou não, as respeite ou não, estarás para sempre acorrentado à elas, pois têm com elas uma dívida de vida e a vida pede ação e pede mudança.
Mas quando todas essas coisas parecem pesar-lhe, sabe o poeta encontrar o descanso nas coisas simples: aprecia então o riso das crianças, o vento que passa e move, magicamente, as folhas que se espalham pelo chão e renova-se a cada vez que encontra-se com a aurora e os seus róseos dedos. Tu és poeta. Diz-me tu então, o que carrega em teu coração que te pesa? e onde tu encontras o descanso para essas coisas tão maiores? tu viajas, porque algo busca ou porque de algo foges?
Então, meu caro amigo, não sei se respondi às suas perguntas, pois cada ser humano é um mistério, um oceano infinito a ser desbravado por si mesmo, mas acredito que consegui te colocar o que me é mais precioso: Escrevo porque Amo.
Passe Bem!
O Náufrago.